quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Parto de palavras

São prenhas
as horas
quando cada minuto conta
e é já tarde
a urgência faz-se
fim
do prazo de validade
e eu grito
de dor
Um começo
Um fim
Palavras
para onde ides?

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Autofagia

Se
as plantas também
têm sentimentos,
só resta aos vegetarianos
a autofagia.

Eu aplico
a autofagia
em tudo.
E por isso
estou a
definhar.

quarta-feira, 17 de julho de 2019

Tratado de chicletes

Posto
chicletes Gorila
(passo a  publicidade),
mas, antes, extraio-lhes o açúcar
todo.
São poemas sem alma.
Hoje é tudo adoçantes,
ou zero.
Ora, ora!
Modas!
Como é que vou
tirar as chicletes
daqui?
Só raspando.

São efémeros os poemas,
como as chicletes.
Mastiga e deita fora.
Há para todos os gostos.
Alguns têm recheio.
Mas não são Gorila.
Que eu saiba.
Enquanto dura o sabor,
são boas.
(As chicletes)

quinta-feira, 27 de junho de 2019

Adeus

Os meus olhos partiram
na direção do comboio
do martírio.
Partiram e não voltaram
mais.
Adeus às paisagens.
Adeus à luz.
Adeus às gentes.
A menina que eu fora não ficou.
A adulta que fui também não permaneceu.
Esta não deixou saudades.
Foi como um prato viscoso
e nojento de qualquer coisa de
águas estagnadas e mal cheirosas.
Eu era uma doença.
Mas veio o escuro,
o silêncio,
a solidão.
Adeus.
Sem nostalgia
- a nostalgia é um luxo -,
só com dor.
Até quando?

quinta-feira, 13 de junho de 2019

Irresponsabilidade

Os deuses movem-se no espaço, contemplando alegremente as misérias humanas. Cospem aguaceiros e sujam as mãos a comer sem quaisquer maneiras, mãos que sacodem, projetando as imundícies - os asteróides - no espaço sideral. Emitem ventosidades com estrépito pelo ânus - trovões e raios - e por meio daquelas também acendem as estrelas. Já os planetas, a lua e outras minudências do espaço não se sabe de onde virão... Talvez dos buracos negros, que são as suas bocas horrendas...
Nós, hipnotizados e alienados, não conseguimos vislumbrar esses deuses.
E eu sinto-me uma pata choca não sei porquê.

E "prontos": escarrei um texto!

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Namoro

É doce
e quente
essa vereda, no final.
Entretanto, é
um caminho difícil;
uma luta
que se trava entre
a noite e o dia,
o sol e a lua,
a terra e o mar.
Parece inglória.
Mas esclarece,
no fundo.
É intergaláctica.
É doce
e quente, no final.
Mas, antes de ser fruto,
é fogo a consumir;
forno de pão a funcionar.
Amor,
onde moras?

sábado, 27 de abril de 2019

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Metas

A caminho das planícies,
navego por declives.
Entretanto, em ti,
toda a hora se faz presença,
como para admirar
os sonhos rosa que espreitam
à esquina do teu dormir sossegado.
E tudo ressurge
renascido,
mesmo que eu
ainda não tenha chegado,
porque o rio
é já ali.

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Departamento

Fecha-se a
noite em redor
da canção em que
assobiava e já não é.
Ficam os arames
farpados do nada,
que magoa mais
que o tudo...
durante horas.
Rejuvenesce
a cor, quando os raios
penetram pelos
buracos dos
caixotes.
Mas, cá dentro,
ainda é escuro.

terça-feira, 26 de março de 2019

Saudade - In memoriam

A ausência faz-se palavra
estranhamente, ou não,
porque recordo os pássaros
que vieram beber na tua mão,
os caminhos de pedras,
então tornados rios,
em sílabas das cores
do arco-íris.
E, nesse instante, contemplo.

segunda-feira, 11 de março de 2019

Ave

É um sorriso
de oceanos,
de montanhas,
de céu com sol abrasador.
Ao florescer,
tudo em redor fica um jardim.
É, no momento,
um voo de pássaro,
ou à vela;
o próprio planador,
ou qualquer máquina voadora,
e, ao mesmo tempo,
aeroporto ou heliporto;
o poiso.
Uma manhã,
uma janela aberta sobre um prado.
É Homem- Menino
sempre a renascer:
estrela-do-mar.
E, então,
querem ser
a sua ave.

sexta-feira, 1 de março de 2019

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Fim de inspiração

Bem cedo,
ficou esquecido o poema,
quando o poeta descobriu
a farsa do Pai Natal.
E, agora,
jazem na fossa
ambos, poeta e poema.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Receita ignóbil, feitiço ou

como fazer das desgraças prendas, ou modelos?

Tem-se lixo biodegradável. Junta-se-lhe uns pozinhos de perlimpimpim. Da frente para trás e de trás para a frente, de cima para baixo e de baixo para cima. Do avesso para o direito e do direito para o avesso. Deitar sal e lágrimas, lágrimas e sal. Mexer. Temperar bem. Mexer. Verter tudo numa caçarola. Deitar para o chão e com um pano absorver. Tornar a pôr na caçarola e, depois, deitar tudo no balde. Perfumar. Deitar na terra. Compostar. Ter muitas, muitas doses de paciência. Deixar transformar em húmus. Plantar e/ou semear. Juntar mais outras doses de paciência e ver crescer as flores ou hortaliças. Colher.

Não esquecer de desinfetar a caçarola ou deitar fora.

Hoje deu-me para isto. Que tal?

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Mar grávido

Navego no céu,
de dia e de noite,
até desaparecer o gosto dos rumos.
Então, componho
contigo
uma sonata liquefeita
no mar grávido.
Quantos peixes se
encontrarão nestas
notas
e se associarão
aos melhores corais
das sonoridades?

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Sabores da poesia e a poesia dos dias.

Os que se alimentam de poesia gostam de chuchar cada verso até ao tutano. O travo que fica no final é o de variados sabores, consoante o tempero aplicado. Por vezes, pode saber a ilusão doce ou salgada, a uma casa inteira... - "Isto sabe a janela" , alguém disse algures, pela mão de Gabriel Garcia Márquez, mas não a propósito de poesia... -; tenho por mim que saber a uma casa inteira alargará os sentidos.
Banqueteemo-nos de poesia. Para estarmos mais armados, até aos dentes, de sentidos. A poesia existe, mesmo quando não se escreve. É quando, às vezes, tem mais valor: a poesia dos dias. Pode saber mal, essa poesia, mas é, por vezes, aquela que podemos apreciar e que nos cabe transformar.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Chuva torrencial

Entre as peles,
branda doçura:
piar de pássaros
ao amanhecer,
mel inconstante,
que ora
escorre,
sem ter nascente.
Melodias etéreas.
Jogos de sons.
Mais um pouco os
frutos, neste semear.
E, do alto do dia,
brindas-me
com chuva torrencial.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Paul

As palavras  sangram,
mas também têm espinhos.
Algumas batem-me à porta.
Ignoro-as
e ei-las
que me fuzilam.
Aaaaaaaaaaaaaaaaaah!
São caminhos de lama
algumas palavras.
E nelas fico atolada.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Plantação

Plantei a poesia
em vasos.
Dei de caras, estes dias,
com frutos letras,
eu que esperava sorrisos
e sol.
Não que as letras sejam más,
mas queria mais.
Talvez tenha de plantar
em terra de quintal
e não num vaso...
Ou talvez
não fosse poesia...